Simulação alimentada por IA modela 100 bilhões de estrelas em tempo recorde

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Os investigadores alcançaram um avanço na astrofísica ao criar a primeira simulação de alta resolução da Via Láctea, representando com precisão mais de 100 mil milhões de estrelas individuais durante um período de 10.000 anos. Este feito foi conseguido através da integração da inteligência artificial (IA) com simulações numéricas convencionais, resultando num modelo que é 100 vezes mais detalhado e 100 vezes mais rápido do que as abordagens de última geração anteriores.

O estudo, publicado em Proceedings of the International Conference for High Performance Computing, Networking, Storage and Analysis, marca um avanço significativo na intersecção entre astrofísica, computação de alto desempenho e IA. Para além das suas implicações para a compreensão da evolução galáctica, esta nova metodologia tem o potencial de revolucionar a modelação noutros campos complexos, como a ciência climática e a previsão meteorológica.

O desafio de simular a Via Láctea

Os astrofísicos há muito procuram criar simulações realistas da Via Láctea, até ao nível das estrelas individuais. Tais modelos são cruciais para testar teorias de formação galáctica, estrutura e evolução estelar em comparação com observações do mundo real. No entanto, simulações precisas de galáxias são notoriamente difíceis devido à vasta gama de processos físicos envolvidos – gravidade, dinâmica de fluidos, explosões de supernovas e síntese de elementos – que operam em escalas de espaço e tempo muito diferentes.

Até agora, os cientistas não conseguiram modelar grandes galáxias como a Via Láctea, mantendo uma alta resolução ao nível das estrelas. As simulações de última geração existentes estão limitadas a um limite superior de massa de aproximadamente um bilhão de sóis, o que significa que a menor “partícula” no modelo representa um aglomerado de 100 estrelas. Esta média obscurece o comportamento de estrelas individuais, limitando a precisão das simulações.

Um gargalo importante é o intervalo de tempo necessário para uma modelagem precisa. Mudanças rápidas ao nível das estrelas, como a evolução de supernovas, só podem ser capturadas se a simulação progredir em pequenos incrementos.

Limites computacionais e a necessidade de inovação

Reduzir o intervalo de tempo, no entanto, exige recursos computacionais exponencialmente maiores. Mesmo com a tecnologia atual, simular a Via Láctea até estrelas individuais exigiria 315 horas para cada milhão de anos de simulação. Nesse ritmo, simular até mesmo um bilhão de anos de evolução galáctica levaria mais de 36 anos do tempo do mundo real.

Simplesmente adicionar mais núcleos de supercomputadores não é uma solução viável. O aumento da contagem de núcleos não se traduz necessariamente num processamento mais rápido devido à diminuição dos retornos em eficiência, e o consumo de energia seria insustentável.

O avanço impulsionado pela IA

Para superar essas limitações, Keiya Hirashima, do Centro RIKEN de Ciências Teóricas e Matemáticas Interdisciplinares (iTHEMS), no Japão, juntamente com colegas da Universidade de Tóquio e da Universitat de Barcelona, na Espanha, desenvolveram uma nova abordagem. Eles combinaram um modelo substituto de aprendizado profundo com simulações físicas.

O modelo substituto foi treinado em simulações de supernovas de alta resolução e aprendeu a prever a expansão do gás circundante nos 100.000 anos após uma explosão, sem exigir recursos computacionais adicionais do resto do modelo. Este atalho de IA permitiu que a simulação modelasse simultaneamente a dinâmica geral da galáxia e fenômenos em escala precisa, como supernovas.

A equipe verificou o desempenho da simulação comparando seu resultado com testes em larga escala usando o supercomputador Fugaku da RIKEN e o Sistema de Supercomputador Miyabi da Universidade de Tóquio.

Resultados e implicações mais amplas

O novo método não só permite a resolução individual de estrelas em grandes galáxias com mais de 100 mil milhões de estrelas, mas também acelera drasticamente a velocidade de simulação. A simulação de um milhão de anos demora agora apenas 2,78 horas, o que significa que os mil milhões de anos desejados poderiam ser modelados em apenas 115 dias, em vez de 36 anos.

Além da astrofísica, esta abordagem tem o potencial de transformar outras simulações multiescala em áreas como clima, oceanografia e ciências climáticas, onde a ligação de processos de pequena e grande escala é crucial.

“Acredito que a integração da IA ​​com a computação de alto desempenho marca uma mudança fundamental na forma como lidamos com problemas multiescalares e multifísicos nas ciências computacionais”, diz Hirashima.

Esta descoberta demonstra o poder de combinar IA e computação tradicional para superar limitações anteriormente intransponíveis na modelagem científica. As implicações para pesquisas futuras em múltiplas disciplinas são significativas